03 dezembro 2007

O Público errou. De novo

Apreciei bastante a manchete do Público de hoje a propósito do referendo das propostas de reforma constitucional da Venezuela, promovido por Hugo Chávez. Um verdadeiro exemplo de isenção e rigor informativo...
Gostei especialmente do prognóstico do ilustre dr. José Manuel Fernandes, expresso no editorial: Se o 'sim' ganhar, como quase todos prevêem, poderá ser por uma margem estreita e o país [a Venezuela], que já está partido ao meio, pode assistir ao êxodo de muitos cidadãos que passarão a recear (ainda mais) pelas suas vidas e pelos seus bens. Se o 'não' ganhar, hipótese em que poucos acreditam, é impossível saber como Chávez reagirá. Mas não se augura nada de bom (...) Afinal, ao contrário do que supunha JMF, ganhou o 'não', e Chávez aceitou calmamente a derrota, como é próprio de um líder democraticamente eleito. O que dirão agora os que, como JMF, insistem em afirmar que a Venezuela é uma ditadura?
_______________________________________
Nota - Já depois de inserido este post, tomámos conhecimento da patética explicação aos leitores apresentada pela Direcção Editorial do Público numa breve nota inserida na edição online do matutino. Escreve a DEP que «o título, além de errado e indefensável num acto cujo desfecho não era ainda conhecido, tomou por facto o que era apenas uma indicação das sondagens à hora do fecho da edição, que davam ao 'sim' entre 53 e 56 por cento e ao 'não' entre 46 e 47 por cento.» E acrescenta que «a forma reservada como a oposição a Chávez reagiu a esses números, apelando apenas à vigilância junto das mesas de voto, reforçou, a essa mesma hora, a errada convicção de que o 'sim' manteria a dianteira.» Confirma, de seguida, que «tal não aconteceu, numa reviravolta surpreendente, ganhando o 'não' por pequena margem (50,7 contra 49,3)», para reconhecer, por fim, que «a manchete do PÚBLICO poderia ter atribuído a vantagem do 'sim' às sondagens, mas nunca ao voto real dos venezuelanos.» Perante este enumerar de enormidades inadmissíveis a qualquer estagiário de jornalismo, o leitor é levado a concluir que a DEP irá demitir-se em bloco - ou que, pelo menos, JMF já terá colocado o seu lugar à disposição. Puro engano. Pelo erro, a direcção limita-se a apresentar «as nossas desculpas aos leitores» e pronto, não se fala mais nisso. Nada que deva espantar quem conhece o estilo da figura: afinal, ainda não há muito tempo, Fernandes fazia coro com os que (como Bush, Blair, Aznar - e Barroso, convém não esquecer) defendiam a invasão do Iraque como única solução para dar cabo de um arsenal gigantesco que, como já se sabia e rapidamente se comprovou, afinal nunca existiu. E, desse outro engano de alma ledo e cego cujo balanço ultrapassa já o meio milhão de mortos, JMF ainda não pediu desculpa a ninguém.