27 abril 2010

As palavras e os actos

Na madrugada de 25 de Abril de 1974, um jovem capitão de 29 anos reuniu os seus homens da Escola Prática de Cavalaria de Santarém. Falou-lhes do estado a que Portugal chegara e terminou dizendo: «quem quiser vir comigo, vamos para Lisboa e acabamos com isto. Quem for voluntário, sai e forma. Quem não quiser sair, fica aqui!».
Vieram todos, sem excepção, mesmo sabendo que corriam riscos, incluindo o risco de não regressar com vida. Ao fim de algumas horas, caía um regime cansado de guerra. É por isso que aqui estamos hoje.
Foram eles os filhos da madrugada. Não caminharam para Lisboa em busca de cargos ou de lugares. Não vieram à procura de um lugar na História – e é justamente por isso que o merecem.
Como o retratou Sophia de Mello Breyner, Salgueiro Maia foi «aquele que deu tudo e não pediu a paga». Um exemplo notável para muitos Portugueses dos nossos dias, que tantas vezes cedem às seduções vazias e efémeras da sociedade de consumo e outras tantas vezes medem o valor dos homens pelo dinheiro ou pelos bens que ostentam.


É verdade: eu poderia ter escrito estas palavras. Mas não, o autor da extensa citação é nem mais nem menos que... Cavaco Silva. Disse tudo isto e muito mais durante a celebração dos 36 anos da revolução de Abril, em plena Assembleia da República! O mesmo Cavaco que, há 20 anos, recusou a Salgueiro Maia uma pensão por relevantes serviços prestados ao país - que, três anos depois, foi atribuída a um bando de pides. Agora, pelos vistos, o corta-fitas de serviço quer mostrar que «evoluiu». E - pasme-se - até elogia Salgueiro Maia e cita José Afonso! Um dia destes ainda o apanhamos a fumar...