24 junho 2010

Saramago, sempre

"Mas não subiu para as estrelas,
se à terra pertencia"

Amigos e inimigos não podem deixar de concordar numa coisa: foi um escritor grandioso e um ser humano interveniente e frontal. Entrou definitivamente na eternidade no dia 18, em Lanzarote, repousa agora em Portugal. Os dias que se seguiram à morte de José Saramago foram férteis em gestos grandiosos, mais do que justamente merecidos pelo único Prémio Nobel de língua portuguesa e autor de uma obra que se destaca pela grande qualidade. Livros como "Levantado do Chão" e "Memorial do Convento", "O Ano da Morte de Ricardo Reis" e "Jangada de Pedra" são, qualquer letrado básico o reconhece, obras fundamentais da literatura lusófona do século XX.
O desaparecimento físico do escritor não apagou um dos seus melhores traços de carácter: Saramago tinha muitos amigos, mas também uma quantidade apreciável de inimigos, felizmente. Porque só os medíocres não têm inimigos. O que pode servir para que se entenda, mas não justifica - bem pelo contrário - o gesto mesquinho do impropriamente eleito presidente Cavaco. Mesmo sabendo que ele não tem estudos para tanto, imaginava-se que o homem se esforçaria por ser mesmo o presidente de todos os portugueses, mas não: é apenas, na melhor das hipóteses, o presidente dos portugueses para quem a obra, os prémios, o percurso literário e humano, o reconhecimento mundial de José Saramago nada diz. Estou em crer que serão muito poucos os que, mesmo não apreciando particularmente os livros e/ou as posições públicas do escritor, se sentirão à vontade para aplaudir um presidente tão falho de tudo, inclusive de sentido de Estado. Justamente aquilo que um presidente não pode perder nunca...