16 outubro 2009

Joga pedra na Maitê?

Tudo isto existe, tudo isto é triste, tudo isto é fado!
A incrível e triste história do vídeo de Maitê Proença é das coisas mais patetas (e mais patéticas) a que me tem sido dado assistir. Num país normal, num tempo normal, num mundo normal, nada disto seria mais do que um episódio irrelevante: uma artista de novela que um dia decidiu fazer uma piada com um lugar que visitou. É uma coisa que faz qualquer um que tenha estado noutro país sem ser o seu. No caso em análise, o resultado foi uma piada sem grande graça, nada que não se faça por cá todos os dias. Herman José já fez muito pior, e também com portugueses (o Estebes é um estereótipo do "murcon" do Norte, tal como a Maximiana ilustra o lugar comum da camponesa boçal), mas nem por isso foi crucificado na praça pública, ao contrário do que está a acontecer com a actriz. E ainda muito recentemente a Televisão pública era palco da alarvidade do Tele-Rural, com um monte de ideias preconceituosas sobre o Portugal-atrasado-do-interior que desfilavam semanalmente no cenário de Curral de Moinas. Mas contra esses não vi qualquer exaltação. E ainda bem, porque a liberdade de expressão não serve apenas para aqueles que têm muita graça - além de que o humor é como o amor: cada qual deve poder praticá-lo como quiser, e ninguém tem nada com isso.
Então, porquê tanto barulho em volta da piada falhada de Maitê? Provavelmente porque ela é brasileira, é bonita e tem sucesso. A verdade, meus caros, é que em muitos aspectos continuamos a ser um país pacóvio e ultramontano - e a histeria colectiva gerada em volta deste episódio (que até teve direito a notíca de destaque nos telejornais, valha-me São Pancrácio!) é a prova mais eloquente disso mesmo. Mais: olhando para boa parte das reacções à piada tosca de Maitê, verifica-se que a indignação (que até poderia ser justa e era, pelo menos, legítima) deu lugar, não raras vezes, à mais torpe xenofobia e ao mais execrável machismo. E de repente deixou de ser Maitê Proença o busílis da questão, eram «os brasileiros» que estavam a ser julgados - e por um crime que nem sequer existiu. E isso, meus amigos, é que não tem mesmo graça nenhuma.

PS -  Não tão a despropósito como parece, a fúria anti-brasileira gerada por este episódio ridículo trouxe-me à memória outros «julgamentos colectivos», como por exemplo este, acontecido em Lisboa há mais de 400 anos. Tal como desta vez, tudo começou por um simples comentário - no caso, bem mais inocente e sério do que as graças de Maitê. Deu no que deu. Por mim, não gostaria que no meu país voltasse a acontecer nada parecido. Nem mesmo apenas por palavras.

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